Friday, June 15, 2007

O Charme de 0,569

Em 1990, quando eu cursava o entao ginasio, o (grande) professor de geografia trouxe aa classe uma reportagem publicada na revista Veja (na epoca, leitura obrigatoria a qualquer estudante cuja ambicao incluia o nivel superior) intitulada "O Charme de 1,8%".

O numero se referia ao crescimento populacional do Brasil no ano e seu charme, argumentava o jornalista, constava na primeira vez em que o Brasil demonstrava um crescimento populacional inferior a taxa de reproducao, "tipico de primeiro mundo" (sic). Isso significa que duas pessoas colocam no Brasil menos de duas pessoas. No longo prazo, a populacao decresceria.

Passados 10 anos, o colegial e um diploma em Economia, o IPEA divulgou nessa semana o indice de Gini de 2004: "0,569". E o menor valor, desde que se tem noticia (isto e, dados confiaveis).

O Indice de Gini e um indicador de desigualdade de renda. Varia entre 0 e 1. Em uma sociedade em que todo mundo recebesse a mesma renda (digamos, o mesmo salario), o indice de Gini seria nulo. Por outro lado, em uma sociedade em que apenas uma pessoa receba toda a renda da sociedade, o Gini seria unitario (imagine um sheik arabe dono do unico poco de petroleo do pais).

O Brasil sempre esteve mais proximo ao caso do Sheik arabe. Os 2 milhoes de brasileiros mais ricos (1%) ganham mais de R$ 6.500/mes. Os 45 milhoes mais pobres ganham menos de R$ 300/mes. Se considerarmos o PIB brasileiro, os 5% mais ricos "ficam" com o dobro dos 50% mais pobres. Se 100 brasileiros produzissem 100 paezinhos, os 5 mais ricos comeriam 32 e os 50 mais pobres dividiriam 16. Numeros como esses fazem do pais o campeao da desigualdade, qualquer que seja o quesito (na verdade, o Brasil reveza o pior lugar da lista com a Suazilandia, um ex-bantustao da Africa do Sul).

Cabem todas as criticas ate o momento colocadas. O indice cntinua entre os tres mais altos do planeta (acima, inclusive, de reinados do petroleo, em que um sheik sozinho recebe praticamente toda a renda do pais), mas e um marco historico. Alguns economistas, claro, argumentam que nao seria historicament epossivel ultrapassar os niveis a que chegamos. Outros, que o indice reflete uma concentracao da renda, dada a reducao da chamada "classe media" (o que e possivel). Finalmente, alguns argumentam que a queda nao e estatisticamente significativa.

Qualquer que seja a conclusao, o numero nao deixa de ter seu charme.

(Isso nao significa que o Brasil seja um pais pobre: o brasileiro medio consome quatro vezes mais que um chines medio e tres vezes mais que um argentino medio. Na media. O problema e que ha poucos brasileiros medios: ha muitos pobres que sao muito pobres e ha poucos ricos que sao muito ricos. Se vc somar o tanto que os poucos ricos consomem com o pouco que os muitos pobres consomem, o brasileiro "medio" consome mais que um chines ou argentino.)

1 Comments:

Blogger itsanada said...

Ei... nao sabia que voce tinha voltado pra esse blog e abandonado o outro...

June 16, 2007 12:56 AM  

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